“Desafio ético e operacional constante”, diz major Rozenszajn sobre 2 anos de guerra
Porta-voz das Forças de Defesa de Israel nascido no Brasil falou a Crusoé sobre 7/10, Hamas, sofrimentos, desgastes e esperanças

Em entrevista a Crusoé, o major Rafael Rozenszajn (foto), porta-voz das Forças de Defesa de Israel (FDI) nascido no Brasil, falou do “período extremamente desafiador” da guerra iniciada com os mais de 1.200 assassinatos e 250 sequestros cometidos pelo Hamas durante invasão ao território israelense em 7 de outubro de 2023.
Rozenszajn exaltou a resiliência do povo de Israel, detalhou o caso dos bebês gêmeos da família Berdichevsky, comentou a neutralização de 25 mil terroristas, abordou o sofrimento de civis na Faixa de Gaza, explicou com exemplos os procedimentos adotados em casos de desvios de conduta e erros militares, e resumiu a essência de seu livro A Guerra das Narrativas (Citadel Editora).
Leia abaixo a entrevista completa.
CRUSOÉ - Qual é o balanço pessoal que o senhor faz dos dois anos do 7 de outubro, considerando perdas e sofrimentos, mas também a esperança e a reação civil da sociedade israelense?
RAFAEL ROZENSZAJN - Do ponto de vista das Forças de Defesa de Israel, os últimos dois anos desde 7 de outubro de 2023 representam um período extremamente desafiador para nossa nação.
Sofremos o maior ataque terrorista contra o povo judeu desde o Holocausto, perdas dolorosas e momentos de sofrimento profundo, que enlutaram famílias e toda a sociedade israelense. Cada vida perdida é sentida de maneira intensa, e nos lembramos constantemente do sacrifício de nossos soldados e civis.
Ao mesmo tempo, esses anos também revelaram a força e a resiliência do povo de Israel. A sociedade civil demonstrou uma solidariedade impressionante, mobilizando-se para apoiar os necessitados, manter a coesão social e reforçar nossa determinação de proteger o país.
A esperança permanece viva porque vemos diariamente a coragem, a união e a dedicação de nossos cidadãos, que, mesmo diante de adversidades extremas, continuam firmes em sua convicção de preservar a segurança e os valores de Israel.
Este período é uma mistura de dor e perda, mas também de resiliência e esperança. Ele reforça nosso compromisso de proteger nossa população e garantir que Israel continue a prosperar, independentemente dos desafios que enfrentamos.
CRUSOÉ - Qual história específica de um indivíduo ou família, civil ou militar, mais impressionou ou comoveu o senhor ao longo desses dois anos?
ROZENSZAJN - Esses dois anos estão repletos de histórias de bravura e heroísmo, e é difícil escolher apenas uma. Mas uma que me tocou especialmente foi a dos bebês gêmeos da família Berdichevsky, de apenas 10 meses, que sobreviveram ao ataque brutal do Hamas ao kibutz Kfar Aza.
Seus pais, Hadar e Itay, sacrificaram-se heroicamente para protegê-los, enfrentando os terroristas até serem assassinados na frente dos bebês.
Os bebês permaneceram sozinhos por mais de 14 horas antes de serem encontrados por soldados das FDI. Eles sobreviveram porque o choro deles foi cruelmente utilizado pelos terroristas como uma isca, atraindo para a casa dos bebês os jovens da segurança do kibutz, que foram assassinados enquanto tentavam resgatá-los — um detalhe trágico que revela a crueldade dos terroristas.
No início da guerra, foi formado um grupo especial de oficiais encarregados de informar as famílias sobre a perda de seus entes queridos. Fui convocado para essa missão, e o momento mais difícil foi dar aos avós a notícia da morte dos pais dos bebês, uma tarefa que realizamos com o máximo de sensibilidade e apoio.
Essa história é, para mim, um símbolo da resiliência do povo israelense, da crueldade de nossos inimigos, e do compromisso das FDI em oferecer proteção e apoio a cada família afetada pelo ataque de 7 de outubro.
CRUSOÉ - Qual é o balanço militar que o senhor faz dos dois anos de guerra, considerando a eliminação de terroristas e o resgate de reféns, mas também a tragédia humanitária e o desgaste de Israel?
ROZENSZAJN - Os dois anos desde o ataque de 7 de outubro representam um período de desafios sem precedentes para Israel e para as Forças de Defesa de Israel.
Do ponto de vista militar, avançamos significativamente no enfraquecimento das capacidades do Hamas e de outras organizações terroristas. Cerca de 25 mil terroristas foram neutralizados, diversas infraestruturas terroristas foram destruídas e praticamente toda liderança do Hamas foi eliminada. O resgate de reféns — em operações extremamente complexas — demonstrou a coragem, a precisão e o compromisso das nossas forças em proteger cada cidadão israelense.
Ao mesmo tempo, é impossível ignorar o sofrimento decorrente da guerra. Cada perda civil — israelense ou palestina — é uma tragédia, e Israel continua comprometido em reduzir danos colaterais, mesmo enfrentando um inimigo que deliberadamente se esconde entre civis e utiliza o sofrimento deles como estratégia de guerra. Esse é um desafio ético e operacional constante.
Sabemos que há um desgaste, tanto interno quanto internacional, mas também existe uma clareza moral: Israel está lutando uma guerra defensiva, pela sua sobrevivência, pela garantia de seu futuro existencial. Por isso, precisamos desmantelar, militarmente e governamentalmente o Hamas, e trazer de volta todos os nossos reféns. Essa é a única maneira de garantir que ataques como os de 7 de outubro nunca mais aconteçam e que nossos cidadãos possam viver com segurança.
O balanço é claro: alcançamos avanços significativos no campo militar, mas permanecemos totalmente focados em proteger vidas e restaurar a segurança e a dignidade de Israel.
CRUSOÉ - O senhor tem argumentado que a ocorrência de mortes ou fome, por mais graves que sejam, não é suficiente para caracterizar genocídio. Que, no Direito Internacional, deve-se comprovar que não há alternativa plausível para explicar as ações. E que as operações das Forças de Defesa de Israel devem ser entendidas como medidas defensivas para impedir ataques terroristas, proteger a população e libertar sequestrados, mesmo que, infelizmente, civis sejam afetados ‘como resultado inevitável de combates em áreas densamente povoadas, onde são utilizados como escudos humanos’. Em que momento esse resultado passa a ser evitável? O que é necessário acontecer?
ROZENSZAJN - O Direito Internacional estabelece que, para caracterizar genocídio ou crime contra a humanidade, é necessário demonstrar a intenção deliberada de destruir, total ou parcialmente, um grupo, e que não há explicação alternativa plausível para as ações.
As operações das FDI são conduzidas com o objetivo de defesa: impedir ataques terroristas, proteger a população e libertar reféns. Esta guerra não é travada contra o povo palestino, mas sim contra o grupo terrorista Hamas.
É inegável que, em zonas densamente povoadas, civis podem ser afetados como resultado inevitável de combates, especialmente quando grupos terroristas utilizam deliberadamente a população como escudo humano.
Segundo dados da ONU e da União Europeia, em conflitos armados em áreas urbanas, morre em média nove civis para cada militar. Na Faixa de Gaza essa proporção é nove vezes menor, refletindo as medidas tomadas pelas FDI para minimizar os danos a civis, mesmo em um cenário extremamente complexo e desafiador.
As FDI conduzem suas operações de forma a reduzir ao mínimo o risco para civis, sem comprometer o objetivo militar essencial. Para isso, utilizam planejamento rigoroso, inteligência precisa, tecnologia de precisão, aviso prévio sempre que possível e criação de corredores de evacuação. A aplicação desses elementos demonstra nosso compromisso com a proteção da vida civil, mesmo em um cenário de guerra extremamente complexo e assimétrico.
O sofrimento de civis é uma tragédia, mas se tornaria evitável se o Hamas deixasse de usar civis como escudos humanos, de transformar escolas em centros de comando, hospitais e residências em plataformas para armamentos e lançamentos de foguetes.
CRUSOÉ - Israel tem assumido erros militares em determinadas ações em Gaza, como a que atingiu o telhado de um hospital, matando um grupo de civis, incluindo repórteres. Também afirma que ocorrem investigações independentes e eventuais punições, o que costuma ser visto com desconfiança em outros lugares. O senhor poderia citar exemplos de casos em que oficiais foram punidos?
ROZENSZAJN - Israel reconhece que, em conflitos complexos como o de Gaza, erros militares podem ocorrer, mesmo com todos os cuidados adotados para proteger civis.
Quando isso acontece, são conduzidas investigações rigorosas e independentes, e eventuais falhas são tratadas com responsabilização disciplinar ou criminal.
Houve casos nos quais oficiais das FDI foram punidos por decisões inadequadas em operações, incluindo suspensões ou abertura de processos internos. Esses procedimentos são conduzidos com total transparência dentro do sistema militar israelense, demonstrando nosso compromisso com a responsabilidade e a correção de erros, algo que, infelizmente, não é prática comum em todos os conflitos ao redor do mundo.
Um exemplo notável ocorreu em abril de 2024, após um ataque aéreo que atingiu um comboio da organização World Central Kitchen (WCK), resultando na morte de sete trabalhadores humanitários. A investigação conduzida pelas FDI concluiu que o ataque foi uma "violação grave' das políticas militares israelenses. Como resultado, o comandante de apoio de fogo da brigada foi demitido, enquanto o comandante da brigada, o comandante da 162ª divisão e o comandante do Comando Sul receberam advertências formais.
Em fevereiro de 2025, cinco reservistas das Forças de Defesa de Israel (FDI) foram indiciados por cometer crimes de agressões e abusos contra um terrorista palestino preso na prisão de Sde Teiman [localizada no Deserto do Neguev, perto da fronteira com a Faixa de Gaza]. Um dos soldados foi condenado a sete meses de prisão.
Essas investigações e punições demonstram que Israel possui mecanismos institucionais para apurar abusos e tomar medidas disciplinares e criminais, reafirmando o compromisso do país com a lei e os direitos humanos, mesmo em contextos de segurança complexos e desafiadores.
CRUSOÉ - Qual é a essência do seu livro A Guerra de Narrativas que o senhor gostaria que cada leitor, ou mesmo quem não leia, tenha em mente ao observar conflitos como o de Gaza?
ROZENSZAJN - O objetivo do livro A Guerra de Narrativas é mostrar que, em conflitos modernos como o de Gaza, a batalha não ocorre apenas no campo militar, mas também na percepção pública, na informação e na interpretação dos fatos. É fundamental que cada leitor — e mesmo quem não leia o livro — compreenda que entender um conflito exige analisar contexto, intenções e estratégias de todos os envolvidos.
No caso de Gaza, por exemplo, é crucial diferenciar entre ações defensivas das Forças de Defesa de Israel, projetadas para proteger a população e libertar reféns, e as ações do Hamas, que deliberadamente colocam civis em risco para atingir objetivos terroristas.
O ponto central é que, antes de formar uma opinião sobre o conflito, é necessário olhar para a realidade completa, e não apenas para os fragmentos que cada narrativa procura destacar.
O livro detalha exemplos concretos de campanhas de desinformação, manipulação midiática e estratégias de propaganda usadas tanto por grupos terroristas quanto por Estados, destacando a importância de se compreender o contexto completo antes de tirar conclusões.
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