Trump ameaça o futuro de grupo de mídia conservadora
O criador da Fox News agora enfrenta seu maior desafio: Donald Trump. A crise expõe os limites da lealdade do império ao magnata

O magnata das comunicações americanas, Rupert Murdoch, aos 94 anos, parece ter descoberto tarde demais que criar monstros midiáticos pode sair caro, especialmente quando eles se voltam contra o criador.
Em um movimento surpreendente, o patriarca da mídia conservadora americana agora enfrenta Donald Trump, o mesmo político que sua rede Fox News ajudou a transformar num fenômeno de audiência, embalando sua primeira eleição.
O racha foi escancarado após o Wall Street Journal, também parte de seu império, publicar reportagens revelando os laços constrangedores e comprometedores entre Trump e Jeffrey Epstein, organizador de badaladas festas com menores de idade.
A resposta de Trump veio com a sutileza de sempre: um processo de 10 bilhões de dólares contra Murdoch e seu jornal, que ignorou a ameaça e seguiu publicando sobre o assunto.
A análise do jornalista Brian Lowry, em artigo para o The Wrap, sobre esse embate é particularmente interessante, pois ajuda a entender a dimensão desse divórcio entre duas figuras centrais do universo político-midiático americano.
Enquanto o WSJ tenta manter seu verniz de independência e seriedade jornalística, o braço Fox News continua oferecendo a Trump o que ele mais aprecia: lealdade incondicional e narrativa sob medida.
Esse contraste revelaria uma velha dicotomia de Murdoch: de um lado temos o magnata que ainda finge gostar de jornalismo de verdade; do outro, o empresário que jamais desperdiça um bom ibope, nem que custe a sanidade da democracia.
É quase poético, ou tragicômico, que Murdoch, arquiteto da mídia conservadora moderna, esteja agora no simbólico banco dos réus do seu próprio projeto. Trump, como se sabe, não trabalha bem com gratidão. Se você não o exalta todos os dias, ele automaticamente assume que está contra ele.
A disputa judicial pode escalar para o campo regulatório. Com Trump de volta à presidência, Murdoch pode ter suas licenças e concessões na mira da FCC, agência que regula comunicações nos EUA. Um exagero? Em tempos normais, sim. Mas estes já não são tempos normais.
Nos bastidores, o drama se mistura à sucessão familiar. Murdoch deseja que seu filho Lachlan, o mais próximo da sua própria linha ideológica, herde o comando da holding que controla tudo, a News Corp.
Seus outros filhos, James e Elisabeth, com posturas mais liberais, são tratados como hereges em potencial. Segundo The Atlantic, Rupert chegou a dizer que seria um desastre ver seus veículos sob controle errado. Errado aqui, naturalmente, significa qualquer um que leia o New York Times sem ranger os dentes, lembrando que eles também são donos do rival New York Post.
A Fox News, por sua vez, age como um adolescente em crise de identidade: bajula Trump em público e evita mencionar Epstein, o nome proibido na casa, como se fosse o Voldemort da política americana. Mas não por escrúpulo jornalístico, e sim porque sabe o que desagrada o seu público e, mais importante, seus patrocinadores.
Analisando esse artigo do The Wrap, fica a impressão de que o confronto entre Rupert Murdoch e Donald Trump é menos sobre política e mais sobre poder, controle e legado. Murdoch sabe que presidentes passam. Ele, ou ao menos a sua marca, quer permanecer como bastião do conservadorismo midiático. Mesmo que, para isso, precise enfrentar a criatura que ajudou a chegar ao poder.
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