Os pontos cegos na decisão de Moraes sobre a tornozeleira
Para ser enquadrado no artigo 359-I, é preciso "provocar atos típicos de guerra contra o país ou invadi-lo"

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes (foto) autorizou medidas cautelares contra o ex-presidente Jair Bolsonaro nesta sexta, 18.
Bolsonaro será obrigado a usar tornozeleira eletrônica, não poderá usar as redes sociais e não poderá sair de sua casa durante a noite, entre 19 horas e 7 horas da manhã.
Também ficou proibido de manter contato com seu filho Eduardo e com diplomatas estrangeiros.
Leia a decisão aqui.
Jair Bolsonaro é acusado dos crimes de coação no curso do processo (art. 344 do Código Penal), obstrução de investigação de infração penal que envolva organização criminosa (art. 2º, § 1 º, da Lei 12.850/13) e atentado à soberania (art. 359-I do Código Penal).
A decisão tem alguns pontos cegos.
Coação no curso do processo
Até agora, não há indicação de que algum ministro da Corte tenha cogitado mudar seu posicionamento no julgamento da trama golpista por causa das atitudes de Eduardo Bolsonaro ou de uma eventual medida do governo americano.
Os réus e as testemunhas já foram interrogados. Jair Bolsonaro atendeu aos pedidos da Justiça. A maior parte das provoas já foi colhida. Cabe agora aos juízes darem o seu parecer.
Segundo Moraes, contudo, vários funcionários da Justiça estariam sob coerção. "O intuito de embaraçar o andamento do julgamento técnico se sorna ao de perturbar os trabalhos técnicos que se desenvolvem no Inquérito 4.781, pela intimidação de autoridades da Polícia Federal e do ministro relator", afirma o documento.
Um dos argumentos para acusar Jair Bolsonaro de coação no curso do processo é que, mesmo que ele não tenha a capacidade de interferir no julgamento, o ex-presidente estaria tomando medidas com esse fim.
O artigo 344 do Código Penal afirma que coação no curso do processo é "usar a violência ou grave ameaça, com o fim de favorecer interesse próprio ou alheio, contra autoridade, parte, ou qualquer outra pessoa que funciona ou é chamada a intervir em processo".
Ao se provar que Jair e Eduardo Bolsonaro usaram de grave ameaça, o crime já estaria configurado.
Atos típicos de guerra
Moraes cita o artigo 359-I do Código Penal, que criminaliza "negociar com governo ou grupo estrangeiro, ou seus agentes, com o fim de provocar "atos típicos de guerra ou invadi-lo".
Os trechos que aparecem entre aspas na decisão de Moraes, contudo, trazem textos diferentes.
Eles falam em "submeter o funcionamento do Supremo Tribunal Federal ao crivo de outro Estado, com clara fronta à soberania nacional" e "negociação com governo estrangeiro para que este pratique atos hostis contra o país".
"Atos hostis" é um termo muito mais amplo que "atos típicos de guerra".
No direito internacional, sanções, como as que foram ameaçadas por Trump, são consideradas como atos que precedem uma guerra.
Tradicionalmente, um país adota sanções como uma maneira de pressionar outra nação a fazer concessões. Se um acordo é feito, a guerra é evitada.
Sanções não são um ato de guerra. Pelo contrário, elas buscam evitá-la.
Não parece haver, nas atitudes de Eduardo e Jair Bolsonaro, negociações para invadir o Brasil ou iniciar uma guerra. Esse tipo de coisa seria pura maluquice.
Mas o que Eduardo conversou com as autoridades americanas não é do conhecimento de todos.
Só temos acesso ao que eles publicam.
Retórica belicosa
O problema, para a família Bolsonaro, é que as declarações de seus membros não ajudam em nada na defesa deles.
Os filhos do presidente têm abusado da retórica belicosa nas redes sociais e em entrevistas para a imprensa.
No dia 16 de julho, Eduardo Bolsonaro escreveu no X: "Presidente Donald Trump não jogou uma bomba nuclear no Brasil — ainda".
Depois, Eduardo disse: "Está muito mais fácil um porta-aviões chegar no lago Paranoá (se Deus quiser chegará em breve), do que vocês serem recebidos com Alckmin nos Estados Unidos".
Na semana anterior, Flávio Bolsonaro falou em "negociação de guerra" e sobre a possibilidade de caírem bombas atômicas americanas no Brasil em uma entrevista para a televisão.
"Então essa situação tem que ser encarada como uma negociação de guerra, sim, onde nós não estamos em condições normais. Nós não estamos em condições de exigir nada por parte do governo Trump. Ele vai fazer o que ele quiser independente da nossa vontade. Cabe a nós termos a responsabilidade de evitar que caiam duas bombas atômicas aqui no Brasil, para depois nós anunciarmos que vamos fazer anistia, para depois nós anunciarmos – que eu acho que é uma segunda coisa que ele vai querer também colocar na mesa da negociação, porque é o que está na carta dele, que é a questão da – liberdade de expressão nas redes sociais“, disse Flávio.
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Comentários (2)
Gustavo Nascimento
2025-07-18 17:02:36Supremo Tribunal Free-style a lei tem de se adequar ao q Exmo Carequissimo-em-Chefe precisa...
Eliane ☆
2025-07-18 15:56:22Eu sou contra o Bolsonaro usar a tornozeleira eletrônica. Não estou entendendo a "lógica "nisso tudo. O Alexandre de Moraes está o tempo todo jogando gasolina no fogo. O que se tornou, transformou o STF?